Do Blog RS Urgente, artigo de Paulo Muzell
Tudo começou no segundo semestre de 2008, quando a Câmara Municipal aprovou um projeto de lei que instituiu o programa de redução gradativa dos veículos de tração animal (VTAs) e de tração humana (VTHs), estabelecendo um prazo de oito anos para se chegar à proibição total e definitiva. O prefeito sancionou o projeto, apesar do seu evidente vício de origem já que criar programas é prerrogativa exclusiva do executivo. A partir daí, aprovada a proibição, as coisas estão acontecendo com espantosa lentidão. Apenas seis meses depois da vigência da lei, em março de 2009, o prefeito assinou o decreto 16.247, criando o comitê executivo do programa de redução das carroças e carrinhos. Temos aí o inusitado: criou-se um comitê de um programa que não existia, para ser mais preciso, que não existe até hoje!
Andando a passos de tartaruga, apenas dezoito meses depois da sanção e publicação da lei, o decreto 16.638, de março passado instituiu o programa dos cursos de capacitação dos condutores de carroças e carrinhos. O decreto criou, também, um fundo municipal para custear as despesas dos programas, fundo que até o momento não tem um real de recursos à sua disposição. Aliás, o orçamento de 2010 alocou 20 mil reais no projeto 1.539 – programa de redução dos VTAs e VTHs, dos quais até agora não foi gasto um centavo sequer! E mais: o decreto estabeleceu prazo de um ano para a realização do cadastramento dos carroceiros e carrinheiros, prevendo a possibilidade de ser ampliado. Significa dizer que se tudo der certo, o cadastro da população alvo deverá estar pronto apenas em março de 2011, dois anos e meio depois do início da vigência da lei. Ora, o cadastro é condição prévia básica para estruturação do programa e a proibição parcial da circulação – em áreas mais centrais – já vai começar dois meses após, em maio de 2011.
Neste contexto, a Câmara Municipal criou em abril deste ano uma Comissão Especial presidida pelo vereador Beto Moesch (PP), sendo o relator o vereador Luiz Braz (PSDB), com a finalidade de acompanhar o andamento do programa e sugerir eventuais correções de rota. A Comissão Especial neste início do mês de agosto apresentou seu relatório. Qualquer pessoa de mediano bom senso, face ao que relatamos – que nesses vinte e dois meses de vigência da lei praticamente nada foi feito -, pensaria que o Legislativo, cumprindo seu papel de órgão fiscalizador, faria o registro do fato, cobrando mais agilidade do Executivo municipal.
Quantos cursos foram concluídos? Quantos empregos foram criados? As novas unidades de reciclagem do lixo estão funcionando? Em caso de resposta positiva, quantos novos empregos foram criados e quantos carrinheiros e carroceiros já estão empregados? Como estão os cursos profissionalizantes na área de turismo que seriam, ou serão criados? Como transformar carroceiros e carrinheiros em agentes de turismo? Por que o fundo municipal do programa não tem recursos alocados e por que o recurso – absolutamente ridículo e insuficiente – constante na lei orçamentária de 2010 permanece intacto, não foi gasto? Não, nada disso preocupou os vereadores que integram a Comissão Especial.
Eles apenas se ocuparam em cobrar do prefeito, da EPTC e dos Conselhos Tutelares rigor na fiscalização. A EPTC tem plenas condições de já em 2011, quando começa a proibição na área central, de fazer cumprir a lei? O Conselho Tutelar estará ágil e vigilante na repressão dos menores que forem flagrados conduzindo carroças? A EPTC vai contratar em tempo hábil os veterinários que deverão cuidar dos cavalos? Foram essas as perguntas feitas pela Comissão. E até instituíram reuniões trimestrais para avaliar a eficiência da fiscalização. Além disso – na contramão da razoabilidade –, o relatório propõe uma redução dos prazos da proibição definitiva, que passaria de 2016 para 2014, contrariando o disposto na lei aprovada em 2008.
A meta é 2014. No ano “sagrado da Copa do Mundo” deverá estar concluída a “higienização da cidade”. Nada de pobre, esfarrapado, sujo e mal cheiroso circulando, fazendo a gente passar vergonha! O que o mundo vai pensar de nós? O que será que vão fazer com as centenas e centenas de moradores que hoje se “hospedam” nos logradouros da cidade? Cocô de cavalo, então, nem pensar! Aqueles eqüinos que circularem – os da Brigada Militar, certamente o farão – deverão portar a higiênica fralda prevista em lei. É esse o quadro, infelizmente. Essa turma que representa a visão “higienizante” não é tão pequena, como se imagina. Na Câmara de Porto Alegre penso que são maioria. Legítimos representantes de uma caolha visão dessa “preconceituosa classe média higienista”.
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