terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Prefeitura explica projeto habitacional a moradores da Vila Liberdade

Samir Oliveira - Fonte Sul 21

Moradores lotaram pavilhão da Escola Antônio Giúdice para ouvir explicações da prefeitura neste domingo (3) | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Em audiência com a comunidade da Vila Liberdade na manhã de domingo (3), a prefeitura de Porto Alegre detalhou o projeto de construção de um loteamento habitacional na região. A reunião ocorreu na Escola Municipal Antônio Giúdice e contou com a presença maciça da população e de alguns ativistas independentes, que se organizam no apoio aos desabrigados pelo incêndio que destruiu 90 casas e afetou 194 famílias na noite de 27 de janeiro.

O complexo habitacional será construído numa área de 88 mil m² entre o número 65 da rua Frederico Mentz, na esquina com o número 600 da rua Diretriz, e a avenida Voluntários da Pátria. Nesta área está, também, o espaço onde hoje se localiza a Vila Liberdade.

Serão dezenas de edifícios com cinco andares e apartamentos de 50 m² com sacadas. As famílias que morarem nos apartamentos térreos poderão construir um puxadinho, aumentando a área útil para 75 m². Além disso, a prefeitura garantiu que o complexo contará com equipamentos públicos, como praças, linhas de ônibus e creches.

Assim como Rosa (centro), diversos moradores questionaram diretamente
secretário de Direitos Humanos | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

O prefeito José Fortunati (PDT) não se fez presente na reunião. Em seu lugar, estavam o secretário municipal de Direitos Humanos, Luciano Marcantônio (PDT), o secretário municipal de Segurança, José Freitas (PRB), o diretor-geral do Departamento Municipal de Habitação (Demhab), Everton Braz (PTB), o titular da Defesa Civil, Ernesto Teixeira (PMDB) e o vice-presidente da Fundação de Assistência Social e Cidadania (Fasc), Christopher Goulart (PDT).

Luciano Marcantônio garantiu que o complexo habitacional será construído em, no máximo, 18 meses. A obra será feita, também, com recursos do programa do governo federal Minha Casa, Minha Vida.

Parte do projeto já está em fase adiantada de tramitação, com licitação concluída, dependendo apenas de uma liberação da Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SMAM). A maior parte, que diz respeito, principalmente, à área mais próxima da Vila Liberdade, ainda está dependendo de estudos iniciais por parte dos técnicos do Demhab, que avaliam as condições do solo do local.

De acordo com o arquiteto Fernando Biffignandi, o solo da região apresenta quatro camadas, sendo a primeira muito fofa, imprópria para a construção de casas. A segunda camada contém o lixo originário do aterro sanitário que havia antes da ocupação do terreno pelos moradores da Vila Liberdade, há mais de 30 anos. A terceira camada estaria contaminada pelo lixo e somente na quarta camada, mais profunda, haveria uma rocha sólida capaz de suportar as estacas de fundações de uma cons
trução.

            
           Luciano Marcantônio agradeceu a população por não ter reocupado área devastada
pelo incêndio | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Devido a essas características, a prefeitura optou por construir prédios de cinco andares, já que as fundações teriam que ser bastante profundas. O arquiteto explicou que seria um desperdício perfurar fundações dessa profundidade apenas para casas.

Moradores reagem de formas distintas ao projeto


Enquanto a prefeitura demonstrava um vídeo com uma animação sobre como será o loteamento habitacional da Vila Liberdade, os moradores da comunidade reagiam de forma distinta à imagem de prédios novos onde hoje estão os barracos. “Meu Deus, que lindo! É mais do que eu jamais tive na vida!”, exclamou uma senhora, visivelmente emocionada.

Outra moradora não gostou da ideia de ser transferida para um apartamento. “Morei minha vida inteira em uma casa, demorei para construir minha casinha, e agora querem me jogar num apartamento? Apartamento para mim é igual a prisão!”, comentou.

Após a explicação dos representantes da prefeitura, a população pôde expor ao secretário de Direitos Humanos suas dúvidas em relação ao projeto. Os principais receios dos moradores são quanto à situação de quem é carroceiro e de quem possui comércio na Vila Liberdade – situações bastante comuns entre a população local.
Os carroceiros se preocupam com o fato de que precisam de espaço para seus cavalos e carroças. E os comerciantes temem não ter mais a possibilidade de possuir um boteco ou mercado nas fachadas de suas casas, como costumeiramente acontece na região. Essas duas situações não chegaram a ser completamente esclarecidas pela prefeitura.
 
Diretor-geral do Demhab, Everton Braz coordena construção do loteamento habitacional 
Foto: Ramiro Furquim/Sul21
“Nenhum carroceiro terá sua fonte de renda prejudicada por este projeto”, garantiu Luciano Marcantônio. Ele disse que a prefeitura “não tem todas as soluções sozinha” e precisa encontrar respostas para alguns casos em “sintonia com a comunidade”. Mas assegurou que “todos os apartamentos têm previsão para áreas de comércio”.

A intenção da prefeitura é cadastrar todas as cerca de 600 famílias da vila, para garantir que o novo complexo habitacional seja destinada somente às pessoas da região. Em 2000, quando foi feito o último cadastro na Vila Liberdade, havia 315 famílias e 296 casas.

Desabrigados continuam sendo atendidos em diferentes situações

As 194 famílias desabrigadas com o incêndio do dia 27 de janeiro se encontram em diferentes situações. Os dados mais atuais vêm de domingo (3) e informam que cerca de 50 pessoas estariam dormindo na Escola Municipal Antônio Giúdice, localizada no bairro Humaitá e bastante afastada da Vila Liberdade. E cerca de 50 famílias já estão com o processo de requisição de aluguel social em andamento.

A situação mais precária é a das famílias que se encontram acampadas em frente à área devastada pelo incêndio. Essas pessoas – a grande maioria, carroceiros – optaram por permanecer em barracas improvisadas com lonas em frente à vila, pois têm medo que a área seja destinada a algum outro tipo de empreendimento e rejeitam o aluguel social por temer que a prefeitura não cumpra sua parte no acordo.

Na sexta-feira (1), a reportagem do Sul21 foi pela segunda vez ao local e constatou que havia cerca de 20 barracas e dezenas de famílias vivendo em uma situação extremamente precária, sem banheiros químicos e acesso à água encanada. Essas pessoas sobreviviam das doações de grupos que atuam de forma independente da prefeitura no auxílio à comunidade, formados principalmente por estudantes e ativistas organizados através das redes sociais

              Presidente da Associação dos Moradores da Vila Liberdade, Erlon Lima elogia ação da prefeitura
Foto: Ramiro Furquim/Sul21

No domingo (3), a reportagem voltou ao local e observou que o número de acampados diminuiu. Além disso, um contêiner da prefeitura fazia as vezes de depósito de mantimentos e cozinha. A prefeitura informou que cerda de 13 famílias que estavam acampadas no local foram transferidas para o loteamento Mário Quintana, próximo da Vila Liberdade, onde foram construídas oito casas emergenciais ecológicas – que possuem 15 m² e banheiro privativo.

A intenção do governo municipal é erguer mais casas e transferir o resto da população acampada para lá. O secretário Luciano Marcantônio garante que essas casas têm uma vida útil de até cinco anos e poderiam abrigar os desalojados enquanto o complexo habitacional é construído.

Prefeitura diz que terreno da Vila Liberdade não irá virar empreendimento privado

Na reunião com a comunidade da Vila Liberdade neste domingo (3), os integrantes da prefeitura garantiram aos moradores que o terreno da região não será entregue para a construção de shoppings ou estacionamentos. “Tivemos que enfrentar uma boataria, diziam que a área iria virar um empreendimento da OAS, isso não irá acontecer”, disse o secretário de Direitos Humanos, Luciano Marcantônio.

O diretor-geral do Demhab, Everton Braz, entregou um documento para o presidente da Associação dos Moradores da Vila Liberdade (Amovil), Erlon Nogueira de Lima, garantindo que a área permanecerá com os moradores da região.

Arquiteto explicou projeto de loteamento habitacional à população | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

A prefeitura tem utilizado a Amovil para realizar a interlocução com a comunidade. Os gestores municipais asseguram que o terreno devastado da Vila Liberdade só será cercado após a permissão da associação. A intenção de cercar a área surgiu para que os desabrigados não voltassem a ocupá-la após o incêndio, o que retardaria o processo de desapropriação para a construção do loteamento habitacional.

O secretário Luciano Marcantônio agradeceu aos moradores por não terem retornado imediatamente ao terreno. “A solidariedade de vocês em não reocupar a área foi fundamental para que pudéssemos agilizar o projeto de loteamento”, disse.

O presidente da associação de moradores, Erlon Nogueira, filiado ao PT, elogiou as iniciativas da prefeitura desde o incêndio do dia 27 de janeiro. “Tudo o que pedimos à prefeitura está sendo encaminhado de forma quase imediata”. Ele disse que o complexo habitacional atende às necessidades da população local. “Conseguimos um formato que vai atender a todos os moradores da região”, assegurou.

Erlon explicou que os próximos passos serão tomados em ações coordenadas com a prefeitura e submetidas ao crivo da comunidade. Ele disse que a associação realiza uma reunião mensal com a administração municipal e que as decisões passam por votação entre os moradores da Vila Liberdade.

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