O Fórum Estadual de Reforma Urbana do Rio Grande do Sul protocolou esta manhã pedido de providências referente a denúncia de despejo a que foram submetidas famílias da Vila Maria em Porto Alegre.
Leia abaixo o texto na íntegra.
__________
URGÊNCIA
Famílias ameaçadas de despejo por força de ordem judicial na
cidade de Porto Alegre – RS
Porto
Alegre, 12 de dezembro de 2014.
EXMO.
SR. DR. LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE DESEMBARGADOR FEDERAL DA 4ª
TURMA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO.
Agravo
de Instrumento nº 5031772-53.2014.404.0000
INSTITUTO
NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
SR.
PRESIDENTE LINDOLFO NETO DE OLIVEIRA SALES
Setor
de Autarquias Sul, Quadra 02 – Bloco O – 10º andar
CEP
70070-946 – Brasília-DF
E-mail:
presidente.inss@inss.gov.br
Fone:
(61) 3313-4064 / 4065
Fax:
(61) 3313-4215
PREFEITO
MUNICIPAL DE PORTO ALEGRE
Exmo.
Sr. Prefeito José Fortunatti
Secretaria
Municipal de Coordenação Política e Governança Local - SMGL
Ilmo.
Sr. Secretário Cezar Busatto
DEMHAB
– Departamento Municipal de Habitação de Porto Alegre
Ilmo.
Senhor Everton Braz
COMATHAB
– CONSELHO MUNICIPAL DE ACESSO À TERRA E HABITAÇÃO
Ilma.
Sra. Presidente Angélica Mirinha
SECRETÁRIA
DE DIREITOS HUMANOS – PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA
Sra.
Ideli Salvate
DIRETOR
DO DEPARTAMENTO DE OUVIDORIA NACIONAL DOS DIREITOS HUMANOS
Sr.
BRUNO RENATO NASCIMENTO TEIXEIRA
PROCURADORA
FEDERAL DOS DIREITOS DO CIDADÃO
Ministério
Público Federal
Exmo.
Dro. Aurélio Veiga Rios
MINISTÉRIO
DAS CIDADES
Exmo.
Sr. Ministro Gilberto Magalhães Occhi
COORDENAÇÃO
DE PREVENÇÃO E MEDIAÇÃO DE CONFLITOS FUNDIÁRIOS URBANOS DO
MINISTÉRIO DAS CIDADES
Assunto:
Solicitação de pedido de providências por parte do Poder
Judiciário e do Poder Público Municipal de Porto Alegre no sentido
de garantir o direito humano fundamental à moradia digna e à cidade
das famílias ameaçadas de despejo por força de ordem judicial.
O
FÓRUM ESTADUAL DA REFORMA URBANA DO RIO GRANDE DO SUL FERU/RS é uma
articulação de entidades e movimentos sociais que defendem e
promovem a agenda da reforma urbana no estado do RS. Dentre as
preocupações dessa rede está a promoção e a defesa dos direitos
humanos, mais especificamente o direito humano à cidade e contra os
despejos. O FERU/RS recebeu nessa data denúncia de ameaça de
despejo de famílias de baixa renda e em estado de vulnerabilidade
social que estão ocupando área denominada de Vila Maria na cidade
de Porto Alegre – RS. O proprietário da área de terras que seria
o INSS – Instituto Nacional do Seguro Social teria ingressado com
pedido judicial de desocupação e a liminar foi deferida, tendo sido
marcado o despejo para o dia de hoje. Segundo informações recebidas
por esta rede, o despejo não se consumou até o presente momento.
No
local estão residindo de modo precário 30 famílias que
literalmente não tem para onde ir! São crianças, mulheres, homens
e idosos que não conseguem mais suportar o pagamento de um aluguel e
tampouco tem acesso à moradia nas políticas municipais de
habitação, as quais, diga-se de passagem, não existem na cidade de
Porto Alegre! Para essas pessoas humildes restam tão somente o duro
mercado imobiliário que não dá condições de aquisição de
moradia para a população de baixa renda da cidade.
As
famílias vivem precariamente nesse local desde Outubro passado e
nunca receberam qualquer auxílio ou atenção da Prefeitura
Municipal que se omite e não entende a situação como sendo um
problema social ou de falta de política habitacional municipal que
era seu dever proporcionar.
Neste
sentido, o FERU/RS clama pelo cumprimento das obrigações legais
brasileiras segundo a normativa nacional1,
das prerrogativas de Direito Constitucional, e ainda internacional2,
dentre eles o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e
Culturais.
Tal
recomendação se fundamenta nas considerações de fato e direito a
seguir:
• O
direito à moradia digna é reconhecido juridicamente como um direito
humano fundamental pelos tratados internacionais de direitos humanos
do qual o Estado Brasileiro é signatário e legalmente obrigado, com
base também no artigo 6º da Constituição Brasileira.
• São
componentes do direito à moradia adequada3
a segurança jurídica da posse, condições físicas de
habitabilidade, o custo acessível, a acessibilidade, a adequação
cultural, o acesso à infraestrutura e serviços básicos e a boa
localização, no caso em tela significa o direito da população de
baixa renda de construir suas moradas em área servida de
infraestrutura e serviços, próximo às opções de trabalho, saúde
e educação.
• O
direito à propriedade já não é mais um direito absoluto e
superior aos demais direitos. Nesse caso é dever do Estado
brasileiro garantir a proteção da propriedade, sem se esquecer de
garantir também a efetividade do direito à moradia digna, em defesa
da dignidade da pessoa humana.4
O Poder Público deverá garantir o direito à moradia das famílias
atingidas pelo despejo. Isso é mais forte ainda quando se verifica
que no caso concreto está sendo ocupado um terreno público que está
abandonado e sem cumprir a sua função social.
• Nos
termos dos Pactos Internacionais firmados pelo Brasil a decisão
judicial deverá ser cumprida respeitando a integridade física e
dignidade humana das famílias despejadas, não deixando nenhuma
pessoa desabrigada e sem acesso à moradia digna. Uma decisão
judicial não pode deixar famílias sem teto, nos termos das leis
internacionais de direitos humanos.
• É
necessário que se cumpra os termos da Resolução nº 87/2009 do
Conselho das Cidades que prevê a necessidade do poder público em
todas as suas esferas impulsionar medidas de mediação de conflitos
em detrimento a ações que possam acarretar mais conflitos ainda e
com potencial de violar direitos humanos.
• Que
o artigo 2º da Lei Federal nº 10.257/2001 Estatuto da Cidade,
preceitua que a política urbana tem por objetivo ordenar o pleno
desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade
urbana, mediante diretrizes gerais, dentre elas:
I
– garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o
direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à
infra-estrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao
trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações;
• De
acordo com a legislação nacional e internacional os despejos ou
remoções significam frontal violação ao direito à moradia,
sendo, por esta razão, a última solução possível para a
resolução de conflitos possessórios.
• A
prática de despejos forçados ocorre quando há a remoção de
pessoas ou grupos pessoas de suas casas contra sua vontade e
constitui grave violação dos direitos humanos, em particular, do
direito à moradia adequada, nos termos da Resolução 1993/77 da
Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas. O Estado
Brasileiro é signatário de todas as convenções relativas aos
direitos econômicos, sociais e cultuais.
•
Solicitamos que sejam respeitados os tratados e convenções do
sistema internacional, especialmente o Comentário Geral nº 4 e 7 do
Comitê DHESC, de proteção dos direitos humanos, que são normas
subsidiárias incorporadas no ordenamento jurídico brasileiro, em
razão do Brasil ser signatário destes tratados e convenções; sob
pena de configurar violação do estado Brasileiro aos Direitos
Humanos a ser julgada em tribunais internacionais.
Recomendações:
1. Seja
suspensa provisoriamente por esse DD. Desembargador Relator a decisão
de reintegrar liminarmente a posse da área, com despejo das famílias
que moram no local, permitindo que as famílias permaneçam
temporariamente no espaço até que o poder público municipal
resolva o problema habitacional dessas famílias e, ato contínuo,
seja instalada mesa de negociações para resolução pacífica do
conflito com a presença de representantes do Ministério Público
Federal, Prefeitura Municipal de Porto Alegre, representantes das
famílias assistidos por advogado habilitado e a Coordenação de
Prevenção e Mediação de Conflitos Fundiários do Ministério das
Cidades.
2. Seja
dada garantia pelo Município de Porto Alegre – RS de que as
famílias em estado de vulnerabilidade social terão garantido o seu
direito à moradia digna respeitado.
3. Seja
garantido auxilio técnico e com recursos pelo Ministério das
Cidades para viabilização de estudo e implementação de
alternativa de moradia digna para as famílias.
Atenciosamente,
Organizações
que atuam no FERU-RS
ACESSO
- Cidadania e Direitos Humanos
AGB-
Porto Alegre - Associação dos Geógrafos Brasileiros - Seção
Porto Alegre
AMOVITA
- Associação de Moradores da Vila São Judas Tadeu
AASCOM
- Associação de Assessoria Comunitária
CAMP
- Centro de Assessoria Multiprofissional
CDES
- Centro de Direitos Econômicos e Sociais
CMP
- Central dos Movimentos Populares
CONAM
- Confederação Nacional de Associação de Moradores
FEGAM-RS
- Federação Gaúcha de Associações de Moradores
Fórum
de Justiça e Segurança Região Noroeste
Fórum
Nacional de Reforma Urbana
IdhEs
- Instituto de Direitos Humanos
MNLM-RS
Movimento Nacional de Luta pela Moradia
MNLM-Santa
Maria
Observatório
das Metrópoles - Núcleo Porto Alegre
Ponto
de Cultura Quilombo do Sopapo
Rede
Planos Diretores Participativos
SAERGS
- Sindicato dos Arquitetos no Rio Grande do Sul
SAJU/UFRGS
- Serviço de Assessoria Jurídica Universitária
SEMAPI
- Sindicato dos Empregados em Empresas de Assessoramento, Perícias,
Informações e Pesquisas e de Fundações Estaduais do RS.
1
Constituição Federal art. 1º, 5º , XXIII, 6º, 170 III e 184 e
186, Lei Federal nº 10.257/2001.
2
Declaração Universal dos Direitos Humanos (artigo 25, parágrafo
1º), Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (Artigo
17), Pacto Internacional dos Direitos Econômicos Sociais e
Culturais (Artigos 11 e 12), Comentário Geral nº 4 e nº 7 do
Comitê de Direitos Humanos Econômicos, Sociais e Culturais,
Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de
Discriminação Racial (Artigo 5º, item “e”), Convenção
Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de
Discriminação Contra a Mulher (Artigo 14. 2 (h) ), Convenção
sobre os Direitos da Criança (artigo 21, ítem 1 e 3; artigo
27,parágrafo 3º), Convenção Americana de Direitos Humanos
(Artigos 11 e 24), Carta da Organização dos Estados Americanos
(Artigo 34), Protocolo Adicional à Convenção Americana de
Direitos Humanos em Matéria de Direitos Econômicos, Sociais e
Culturais (Artigo 11).
3
Segundo Comentário Geral nº 4 do Comitê de Direitos Econômicos
Sociais e Culturais das Nações Unidas. Fonte: Comitê dos Direitos
Econômicos, Sociais e Culturais. Comentário Geral n. 4, direito à
moradia adequada (Art. 11 (1) do PIDESC) (Sexta Sessão, 1991),
para. 8(a), UN Doc. HRI\GEN\1\Rev.1 at 53 (1994).
4
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DIREITO FUNDAMENTAL AO MEIO AMBIENTE. DIREITO
À MORADIA. DIGNIDADE PESSOA HUMANA. PONDERAÇÃO. RECOMPOSIÇÃO DO
MEIO. DESIGNAÇÃO DE NOVO LOCAL PARA HABITAÇÃO DA FAMÍLIA.
Tendo em vista que não há direito fundamental absoluto, havendo o
embate entre o direito fundamental difuso ao um meio ambiente hígido
e o direito fundamental à moradia, que perpassa pela dignidade da
pessoa humana, em que pese a prevalência geral do primeiro, porque
sensível e afeto a toda a coletividade, há casos da prevalência
deste, afim de garantir o mínimo existencial no caso concreto.
Trata-se de prevalência, jamais total subrogação de um sobre o
outro. Desta forma, demonstrada ocupação de área de preservação
permanente ou terreno de marinha, com fins de moradia por tempo
considerável, deve o posseiro demolir a construção ilegitimamente
levada a efeito, recompondo o meio integralmente ou pagando multa
indenizatória direcionada para tal fim. Entretanto, a desocupação
somente poderá ser efetivada após garantia do Poder Público de
designação de novo local adequado para moradia da família. (TRF4
- APELAÇÃO CÍVEL Nº 2005.04.01.020586-8/SC, Relatora Dês.
Federal Maria Lúcia Luz Leir, julgado em 15/09/2009)
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