segunda-feira, 8 de setembro de 2014

TPC economiza R$ 20 mi em indenizações


Opção foi aceita em 72% das negociações de áreas afetadas por obras de mobilidade da Copa em Porto Alegre
Rafael Vigna
Índice é aplicável em outras regiões, diz Maria Alice
Índice é aplicável em outras regiões, diz Maria Alice. MARCELO G. RIBEIRO/JC
A Secretaria Municipal da Fazenda (SMF) divulgou, em julho, a lista das transferências de potencial construtivo (TPCs) referentes às intervenções realizadas em terrenos e imóveis de Porto Alegre, afetados por quatro obras de mobilidade planejadas para a Copa do Mundo. Até o mês passado, as 53 adesões no âmbito das negociações administrativas municipais geraram uma economia superior a R$ 20 milhões, com a cedência do equivalente a 23,7 mil metros quadrados em índices.
A lista dos proprietários está disponível no Portal da Transparência da prefeitura. A modalidade funciona como uma espécie de indenização alternativa às pessoas físicas e jurídicas, uma vez que os índices, repassados pelo poder público aos proprietários atingidos, despertam o interesse de empreendedores que pretendem aproveitar os níveis máximos estabelecidos pelo Plano Diretor para novas construções no que se refere à altura, afastamento lateral ou a taxa de ocupação estipuladas em cada uma das macrozonas da Capital.
A arquiteta Maria Alice Michelucci Rodrigues, responsável pela supervisão dos processos de TPC na SMF, explica que os valores envolvidos nestes processos de desapropriação deixaram de sair dos cofres públicos. Ao todo, 29 pessoas físicas e 24 CNPJs optaram pela TPC como forma de compensação por algum tipo de modificação em suas matrículas.
Entre as pessoas jurídicas, encontram-se empresas como a Cia Zaffari (na av. Teresópolis), a imobiliária Rossi, por meio do residencial Fiateci (na av. Voluntários da Pátria), a Real Empreendimentos (na av. Severo Dullius) e o complexo logístico Twin (na av. Voluntários da Pátria). Todos podem aplicar os índices nas mesmas áreas, como forma de verticalizar a construção, por exemplo, ou em projetos futuros.
Na outra ponta, ao receberem os índices, os donos dos imóveis pessoas físicas estão aptos a negociar com empreiteiras em um mercado que também tende a ser valorizado pela retomada dos leilões de solo criado. Depois de 12 anos sem ofertas, um certame, em maio, arrecadou R$ 85,8 milhões. A quantia superou em mais de 6,5% a estimativa de R$ 80,4 milhões referentes à alienação de 42,150 mil metros quadrados em cinco macrozonas.
O montante arrecadado, por sua vez, é integralmente destinado às obras de infraestrutura, de implantação do Metrô e do Sistema Bus Rapid Transit (BRT), dentro das regras já definidas pelo Fundo da Copa do Mundo de 2014 (Funcopa). “A vantagem ocorre também para o proprietário, pois já existia um mercado para estes índices. Há muito tempo não aconteciam leilões, que representam o mesmo índice, porém em situação diferente. Ambos são aplicados em empreendimentos e imóveis, mas uma fonte é o solo criado, via leilão, e a outra é o potencial originário destas desapropriações. Estes dois focos têm o mesmo mercado, que tende a ser aquecido pela continuidade do boom da construção civil”, comenta.

Rápida adesão ao processo pode ser bonificada em até 20%

Diferentemente dos leilões, que tratam da oferta de uma parcela do estoque público de solo criado, as TPCs permutam uma fatia, ou o total dos imóveis atingidos. Além disso, a Lei Complementar nº 703/12 possibilita que o pagamento em índices seja acrescido de 20% ou 10% – dependendo do prazo de adesão estipulado pela negociação administrativa.
A arquiteta Maria Alice Michelucci Rodrigues esclarece que as aquisições feitas em leilão possuem prazo de uma década para a aplicação e correspondem apenas à macrozona especificada pela a alienação. Já os índices oriundos de TPCs não têm limites fixados de tempo e podem ser aproveitados em qualquer área da Capital. Para isso, é preciso aplicar um complexo cálculo de equivalência que considera algumas especificidades de cada zoneamento.  “É como se o proprietário levasse o terreno no bolso”, simplifica.
Pelo viés das construtoras, é admissível sobrepor os índices até alcançar o máximo estipulado pelo Plano Diretor. Assim, se o nível relativo a um determinado terreno for de 1,3%, por exemplo, a área construída não poderia ultrapassar os 130 metros quadrados. Como o Plano Diretor de Porto Alegre prevê, na maioria dos casos, um valor referencial teto de 3%, o saldo de 2,7% só se aplicaria por meio da aquisição de solo criado, negociado em leilão, ou de TPCs, compradas, de forma direta, dos proprietários das matrículas.

Adesões já superam os registros da 3ª Perimetral

Em média, 60% das negociações administrativas das desapropriações por ocasião da terceira perimetral, em 1998, foram feitas via Transferência de Potencial Construtivo (TPC). Agora, as obras de mobilidade para a Copa do Mundo atingem índice superior a 72% dentro da mesma modalidade. A arquiteta da SMF, Maria Alice Michelucci Rodrigues, afirma que, há 16 anos, a modalidade também teve “excelente” aceitação, mesmo que na ocasião as transferências fossem caracterizadas como uma espécie de emissão de títulos imobiliários podres.
Segundo a servidora, no entanto, trata-se de uma vantagem sem igual para o município. Isso porque, além da adesão imediata às negociações administrativas – fato que evita o alongamento de um processo judicial – a posse do terreno também ocorre de maneira mais rápida. “São dois ganhos em um só repasse. Evitam-se os grandes gastos com ações judiciais e há uma adesão imediata, que é crucial para a celeridade nos processos de desapropriações.
Na prática, após a abertura do processo administrativo, avaliam-se as benfeitorias, instalações de água e rede elétrica das áreas afetadas.  O proprietário passa a contar com as duas opções: indenização em dinheiro ou a TPC.  Em algumas situações, não há interesse do município em colocar todo o potencial constritivo referente ao terreno, pois existe uma política de gestão destes ativos que não pode colidir com a realização de leilões.
“O que faz a procura é o mercado imobiliário. Não há interesse do município em barrar as ofertas. Todavia, como se trata de um ativo, não podemos depreciá-lo com muitos leilões, nem deixar com que a escassez de certames torne o mercado estanque. É uma compensação que exige equilíbrio para que não haja perda dos dois lados”, afirma.
Além disso, é preciso acompanhar o mercado para evitar que investidores utilizem os índices para a especulação. É possível que isso ocorra em razão do ágio atrelado aos índices. No leilão de maio, a valorização chegou a 41% nas alienações da macrozona 1. “Isso demonstra que há gordura para queimar, porém, acho muito pouco provável, em razão da grande demanda para por novos projetos”, analisa Maria Alice.
Os incentivos e o mercado em ascensão, no entanto, atraíram a atenção do proprietário da Ferragem Cofel. João Pedro Müller conta que a largura de seu terreno sofreu reduções provocadas pelo traçado previsto para as obras de duplicação da avenida Voluntários da Pátria. Müller prefere não divulgar os valores envolvidos, mas demonstra satisfação com a opção. “Recebi em uma espécie de terceira moeda, consegui repassá-la rapidamente”, comenta.
Na transação, o empresário recebeu um bônus equivalente a 20% do valor referencial em índices pela rápida adesão ao processo administrativo. Foram necessários menos de dois meses com a escritura pública em mãos até que Müller fosse procurado e fechasse a venda para uma construtora.

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