O contexto de Porto Alegre e a necessidade de constituição de um Fórum Sul
por Fórum Estadual da Reforma Urbana/RS
Os avanços legais e democráticos vividos no Brasil desde a década de 70 decorrentes de lutas históricas impulsionadas pelos movimentos sociais oportunizaram ao país, nesta década, um momento impar para a efetivação dos Direitos Humanos no Brasil, em especial o direito à cidade e à moradia. Porto Alegre sem dúvida foi uma das protagonistas deste processo, deixando suas marcas nessa história de conquistas.
Infelizmente o desejo inquietante da sociedade brasileira de sediar um evento esportivo internacional, associado aos interesses do mercado estrangeiro e mascarado pelas grandes agências de publicidade, vem provocando, em nome de uma “oportunidade de negócio” e do “rápido desenvolvimento” violações aos direitos humanos, os quais materializam-se nas nossas cidades através dos despejos massivos, da periferização da pobreza, da apropriação privada dos espaços públicos e da reserva de áreas para os projetos do capital.
Pela perspectiva da tal oportunidade de negócio as cidades passam a ser reduzidas a apenas um de seus aspectos, o econômico. Escapam desta perspectiva os demais aspectos de uma cidade, em especial os sócio-territoriais, que são aqueles que de fato traduzem a diversidade urbana e a estrutura multifacetada das cidades, em qualquer lugar do mundo.
Em Porto Alegre, assim como nas outras cidades do país que estão sendo engolidas pelos projetos do capital “necessários” aos eventos esportivo, as ditas violações contam com o apoio do poder público, através de ações indiretas, de investimentos públicos e da operacionalização distorcida de programas sociais pois:
- O Governo Municipal privilegia e viabiliza o valor de troca no lugar do valor de uso. Promove a exclusão com a utilização das próprias conquistas populares como é exemplo de instrumentos urbanísticos (AEIS) que definem a localização dos reassentamentos, programas habitacionais como o MCMV, programas de mobilidade urbana (PAC) entre outros;
- Não demonstra intenção em articular políticas públicas como a Política Nacional de Resíduos Sólidos com programas habitacionais. Moradores cuja sobrevivência depende da coleta de materiais recicláveis precisam optar entre manter a renda ou acessar casa nos reassentamentos. Mais de 150 famílias da Vila Dique que dispõe de carroça ou carrinho como instrumentos de trabalho estão excluídos do acesso à moradia no reassentamento;
- Utiliza o marketing como ferramenta de governo valorizando sua imagem e repercussão na mídia e desconsidera ações que possam garantir de fato direitos fundamentais como o direito à educação, saúde e renda nos reassentamentos. A “Copa passa por aqui” em outdoor mostrando o reassentamento da Vila Dique não explica a falta de escola, o fato dos prontuários das famílias que foram transferidas ainda permanecerem no posto de saúde de onde foram removidos, distante do local da atual moradia;
- Não informa que menos de 50% das famílias da Vila Dique foram reassentadas em quase 03 anos e que os remanescentes estão frequentemente privados de serviços, infraestrutura e sem perspectiva de serem reassentados. Criou a expectativa da casa nova e deixou centenas de famílias a mercê da oscilação de oferta de serviços. Frequentemente observa-se notícias e manifestações de moradores que estão sem energia elétrica, sem água ou coleta de lixo;
- Mercantiliza o direito à moradia através de parcerias que garantem o lucro máximo aos agentes privados. Não há regulação, controle do preço da terra ou sanções ao não cumprimento da função social da propriedade. O governo se ausenta da discussão e se coloca como vítima desse maquiavélico processo de exclusão social e violação de direitos. Famílias silenciadas pelo discurso assistencialista são expulsas de suas casas e pulverizadas através de instrumentos como aluguel social impedindo-os de reclamar moradia definitiva e de mobilizarem-se com seus ex-vizinhos.O caso mais emblemático é o da comunidade do Túnel Verde, zona sul de Porto Alegre;
- O poder público municipal se abre ao mercado imobiliário e permite este se espraiar na cidade promovendo remoções e a relocalização da população pobre para áreas sem infraestrutura, carente de serviços e que comprometem a renda de milhares de famílias que precisam arcar com o custo dessa nova localização.
- Porto Alegre prioriza a doação de terras públicas urbanizadas oferecendo privilégios para o setor imobiliário utilizando-se do argumento da promoção de megaeventos. Doação de área para o Estádio Olímpico e para Jóckey Clube são apenas dois exemplos da forma como o patrimônio público, bem imprescindível para habitação popular, foi transferido gratuitamente para o setor privado tirando de milhares de famílias a possibilidade de moradia próxima aos locais onde construíram suas vidas.
O Fórum Estadual de Reforma Urbana do Rio Grande do Sul compreende que é uma situação que ocorre na maioria das cidades brasileira. Porém, entende a cidade como uma construção coletiva; o espaço da vida real onde deve ser garantido o acesso a terra urbanizada; a aplicação da função social da propriedade e o direito ao exercício da democracia. Democracia do ponto de vista do cidadão e não do Banco Mundial, onde a população se reconheça como tal, não apenas conscientes de seus direitos, mas capazes de resistir e de transformar suas vidas e a sociedade.
Reconhece, também, que é preciso reagir, e que essa reação passa pela exigibilidade dos direitos conquistados e garantidos pelo Estado Brasileiro. Nesse sentido, considera imprescindível e urgente a articulação das entidades e movimentos sociais em um Fórum de luta pela reforma urbana, articulado à rede nacional – FNRU. A organização do Fórum Sul é fundamental para uma intervenção em rede pela efetividade das políticas públicas, para formular posições coletivas, para estimular a mobilização com a sociedade, devendo atuar de forma autônoma em relação aos governos e partidos políticos, exigindo que esses se posicionem em relação aos seus papéis na sociedade.
Por isso o Fórum Estadual de Reforma Urbana do Rio Grande do Sul convida os movimentos populares, entidades e organizações não governamentais dos estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul para se somar à luta na consolidação do FNRU-Sul.
Como passo importante dessa mobilização está a reunião que possibilitará o diálogo entre as organizações interessadas no engajamento nessa luta e representantes da Coordenação Nacional do Fórum Nacional de Reforma Urbana. Abaixo as informações referentes ao evento.
PROGRAMAÇÃO
DATA: 03 de março de 2012
LOCAL: Assembléia Legislativa do Estado do RS – Sala Maurício Cardoso
Praça Marechal Deodoro, 101 - Porto Alegre/RS - (51) 3210.2000
HORÁRIO: 9hs – 16hs
Entidades que compõe o Fórum Estadual de Reforma Urbana do Rio Grande do Sul:
ACESSO - Cidadania e Direitos Humanos
AGB-PA - Associação dos Geógrafos Brasileiros - Seção Porto Alegre
AMOVITA - Associação de Moradores da Vila São Judas Tadeu
CAMP - Centro de Assessoria Multiprofissional
CDES - Centro de Direitos Econômicos e Sociais
CIDADE-Centro de Assessoria e Estudos Urbanos
CMP - Central dos Movimentos Populares
CONAM - Confederação Nacional de Associação de Moradores
Fórum de Justiça e Segurança Região Noroeste
IdhEs - Instituto de Direitos Humanos
IPES – Instituto de Planejamento e Estudos Socioambientais
MNLM-RS Movimento Nacional de Luta pela Moradia
Observatório das Metrópoles – Núcleo Porto Alegre
Ponto de Cultura Quilombo do Sopapo
Rede Planos Diretores Participativos
SAJU/UFRGS - Serviço de Assessoria Jurídica Universitária
SEMAPI - Sindicato dos Empregados em Empresas de Assessoramento, Perícias, Informações e Pesquisas e de Fundações Estaduais do RS.
FNRU - Fórum Nacional de Reforma Urbana
Porto Alegre-RS, 27 de Fevereiro de 2012.
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