O b j e t
o -
Pedido
urgente de providências a serem tomadas pelo Ministério Público em
defesa de direitos humanos fundamentais de multidões pobres sob
perigo iminente de terem agravadas as violações do seu direito
humano fundamental à moradia, por força dos megaeventos da Copa
do Mundo em Porto Alegre.
As
associações de moradores infra identificadas, juntamente com as
organizações abaixo firmatárias, que atuam em defesa dos direitos
humanos, nesta capital, por suas/seus representantes legais, vêm,
respeitosamente, perante Vossa Excelência, expor e requerer o que
segue:
- O contexto fático deste pedido.
A
realização da Copa do Mundo de 2014, aqui no Brasil, está criando
em todo país, ao lado de uma justificável expectativa positiva,
efeitos econômicos, políticos, sociais e jurídicos que já estão
ameaçando e, em alguns casos, violando direitos humanos
fundamentais, especialmente daquelas populações pobres, residentes
em áreas urbanas vizinhas de estádios de futebol onde os jogos
serão realizados ou afetadas direta ou indiretamente por obras
urbanísticas do entorno, exigidas pela FIFA.
Porto
Alegre, lamentavelmente, está sofrendo desse mal. As obras de
alargamento da Avenida Tronco, que até já tiveram início, mesmo
que a obra não seja exigência do caderno de encargos da Fifa para a
realização dos jogos da Copa do Mundo nesta capital, aceleram-se
por força da data de 2014. Estão ameaçando seriamente mais de mil
e quinhentas famílias que residem próximas do seu traçado, ou
sobre o mesmo, levando insegurança, intranqüilidade e sofrimento
para todas/os as/os moradoras/es daquela parte da cidade.
A
população da Vila Floresta, situada na cabeceira leste do aeroporto
Salgado Filho, está sendo mantida precariamente, até novembro
deste ano, apenas, em virtude de um acordo provisório celebrado com
a Infraero, no Cejuscom da Justiça Federal. As/os moradoras/es do
Morro Santa Tereza, fronteiro ao estádio Beira Rio, aguardam decisão
do Governo do Estado, em área pertencente à Fase (Fundação de
Atendimento Socio Educativo) sobre um pedido de concessão de uso
como forma de garantir a sua moradia.
Numa
frente que se poderia chamar de comunitária, as requerentes têm
tomado iniciativas diversas de defesa dos seus direitos já
consolidados pela antiguidade e relevância da suas posses.
Provocaram já assembléias, audiências públicas comunitárias na
sua região, audiências públicas na Câmara de Vereadores,
audiência pública com o Ministério Público Federal, reúnem-se
com autoridades responsáveis pelos serviços públicos relacionados
com o direito à moradia e denunciam atos e fatos capazes de porem em
risco os seus direitos. É aí que esse esforço coletivo ganha força
em outra frente que se poderia chamar de frente política. Nesse
momento aparecem enfrentamentos diversos e até conflitos sociais
graves com outras pretensões públicas e, ou, privadas, de dar-se
destino incompatível com a manutenção de posse das moradias
existentes em cada um desses locais.
Para
mais cômoda formação do convencimento de Vossa Excelência sobre o
que se pede infra, os fatos que legitimam e justificam este pedido
serão detalhados separadamente, a) conforme a real situação vivida
pelas/os moradoras/es de cada uma dessas áreas, em risco de perder
suas posses, b) conforme o tratamento político-jurídico que a
elas/es tem dado o Poder Público; c) com a lembrança dos direitos
que titulam e estão ameaçados ou já foram violados.
2.
Área da Avenida Tronco - Vilas Divisa-Cristal.
2.1.
Entre outras regiões da cidade, em que o direito humano fundamental
à moradia está ameaçado, essa é, talvez, aquela onde esse risco é
mais acentuado e as providências infra requeridas mais urgentes.
2.2.
As/os moradoras/es desta região urbana (região de
planejamento 5), cerca de 1.500 (um mil e quinhentas) famílias,
afetadas/os pelas obras de alargamento da Av.Tronco estão vivendo,
atualmente, sob as seguintes propostas do Município, a maioria sem a
segurança nem a certeza de como e quando serão cumpridas
oficialmente:
2.3.
Pagamento de um bônus moradia de R$ 52.000,00 (cinqüenta e dois
mil reais) para quem quiser se mudar de imediato, independentemente
da localização e do tamanho das posses, dinheiro esse visivelmente
em desacordo com o valor de mercado de muitas delas e inviável para
a aquisição de moradia com terreno regularizado dentro da região
que atualmente residem as famílias, o que é desejo manifesto de
grande parte das/os moradoras/es afetadas/os. Isso caracteriza um
despejo silencioso e a transferência dos problemas até para
municípios vizinhos, conforme comprova um recente estudo realizado
pela PUC (dissertação de mestrado da professora Betina Ahlert,
disponível na internet sobre o Pisa), sem falar no fato de que abre
a possibilidade de tratamento não isonômico entre as famílias,
como ocorre, por exemplo, com quem adquire uma casa de valor inferior
ao do bônus e não pode aplicar a diferença na melhoria da casa
adquirida.
2.4. Aluguel
social que, como no referente ao bônus, não vai permitir às/os
moradoras/es a mesma qualidade de vida que elas/es atualmente
usufruem com os serviços públicos bem próximos de onde moram como
postos de saúde, escolas e acesso fácil ao transporte. Isso tem o
mesmo efeito da chamada “casa de passagem”, gerando transtornos
às crianças que, ou trocam de escola ou de creche mais de uma vez,
num curto espaço de tempo, ou para se manterem nas atuais
instituições de ensino, terão que aumentar o deslocamento para as
escolas onde estudam, afetando também a vida das mães que,
sabidamente, tem dupla jornada de trabalho. Isso vale, igualmente,
para as famílias que sofrem doença e têm que trocar até de postos
de saúde e médicas/os.
2.5.
Possibilidade de as/os moradoras/es se inscreverem no programa Minha
Casa Minha Vida. Elas/es não sabem onde nem quando as obras desse
programa vão sair do papel, embora as de alargamento da Av.Tronco já
tenham sido até iniciadas. Por outro lado, as empresas que se
habilitarem a construção das casas financiadas por esse programa
serão diretamente subvencionadas pelo Município, de acordo com lei
municipal recentemente aprovada.
2.6.
Para viabilizar e obter adesão a tais propostas, representantes do
Município têm distribuído de casa em casa um formulário onde
figuram três opções abertas para as/os moradoras/es (bônus
moradia, aluguel social, Minha Casa Minha vida). Um escritório foi
instalado no local para viabilizar exclusivamente o bônus moradia,
sem respeitar as outras opções já antecipadas pelas/os
moradoras/es durante a coleta dos dados relacionados com o
cadastramento sócio-econômico. Isso está sendo feito em flagrante
desrespeito a iniciativas político-jurídicas montadas anteriormente
pelas associações de moradores dali, como a substanciada sob a
exigência de “Chave por chave”, em caso de mudança. Essa forma,
apoiada por movimentos populares organizados em defesa da moradia e
de outros direitos humanos, de que dão exemplo o Comitê Popular da
Copa e o Forum Estadual da Reforma Urbana, entre outros, só admite
a saída do/a morador/a do local onde reside para outra residência
por ele conhecida e aceita na região.
2.7. Para
“facilitar”, então, o cumprimento dos acordos que, porventura,
sejam celebrados com base naquelas propostas, a legislação do
município foi recentemente modificada, em mais uma prova de que as
obras da Copa do Mundo estão transformando Porto Alegre numa
“cidade de exceção” como a doutrina qualificada sobre essa
matéria vem identificando cidades submetidas às exigências da FIFA
que desrespeitam qualquer ordenamento jurídico que as contrarie 1.
Atropelam-se, assim, justamente aquelas disposições de lei que
favoreciam a mudança das/os moradoras/es residentes nesta área da
cidade, para locais próximos daquele onde atualmente vivem, aí se
desrespeitando, também, o princípio jurídico consagrado até no
Direito Internacional de proibição do retrocesso social.
2.8. Na
verdade, o que pode ter como efeito disso tudo é um verdadeiro
seqüestro por parte das empresas que realizarão as obras de
alargamento da Av. Tronco, vilas Divisa-Cristal, de toda uma herança
deixada pela luta histórica das/os moradoras/es de lá, por
políticas públicas muito mais urgentes e necessárias, como a que
defende garantia para execução de obras em favor de escolas, postos
de saúde, creches e postos de bombeiros, além de hospitais.
2.9. Nos
itens 5 deste pedido, as requerentes estão lembrando, em
correspondência com o que acima expuseram, as disposições de lei
que apóiam as reivindicações formuladas infra, sobre esta área
da cidade.
3.
Área imóvel do Morro Santa Tereza, fronteira ao estádio Beira Rio.
3.1. Graças
a uma intensa mobilização do povo pobre residente no Morro Santa
Tereza, em defesa do seu direito a moradia, o Poder Executivo do
Estado do Rio Grande do Sul, gestão 2006-2010, retirou da Assembléia
Legislativa um projeto de lei (n° 388), que pedia autorização do
Legislativo Estadual para alienar ou permutar um imóvel de domínio
público, pertencente à Fase, com mais de 70 hectares, situado neste
Morro.
3.2. Ali
residem milhares de famílias organizadas em várias associações de
moradoras/es (Padre Cacique, Vila Gaúcha, Ecológica, União-Prisma)
e mais não reivindicam do que o reconhecimento do direito à
concessão de uso das suas velhas posses, exercidas sobre bem de
domínio público, garantidas pela Medida Provisória 2220/2001.
3.3. Embora
parcialmente tranquilizadas por um Decreto do atual governador Tarso
Genro (nº 48.029/2011) em garantia do
seu direito de morar, estão padecendo de uma tramitação
extraordinariamente demorada e confusa sobre o pedido que fizeram,
alheia ao seu direito de ser bem informada do que está acontecendo,
seguidamente ameaçadas de verem reduzido a nada o esforço coletivo
que empreenderam em defesa daquelas mesmas posses, para alcançarem
prova hábil e documental desse mesmo direito. Como acontece com as
obras projetadas para a Av. Tronco, toda hora aparece lá na região
uma informação preocupante, a respeito, da qual elas não têm como
e onde confirmar se procedem ou não.
3.4. Nos
itens sob nº 5 infra, apontarão as requerentes, igualmente, as
bases legais que lhes dão esperança de que essa população veja
concretizada, com documentação hábil, registrada em cartório, a
garantia do seu direito de morar.
4.
Área imóvel da Vila Floresta, na cabeceira leste do aeroporto
Salgado Filho.
4.1. Aqui
sobraram ainda 42 famílias, resistindo a uma iniciativa da Infraero,
com a sua mudança felizmente prorrogada para novembro do corrente
ano, e com destino conhecido e aceito por 40 delas, em condomínio
situado no bairro Camaquã, do tipo Minha Casa Minha Vida. Isso se
deve a uma intervenção oportuna do Cejuscon da Justiça Federal,
que conseguiu negociar essa transferência com a Infraero, a
Secretaria de Habitação do Estado, o Demhab e - note-se bem - a
participação ativa da comunidade em todo o processo de discussão
das alternativas.
4.2. A
presença da sua representação nesta iniciativa, mesmo assim,
Senhor Procurador, se deve ao fato de que ela quer, não só
forrar-se do risco de, em se esgotando aquele prazo, as obras daquele
condomínio ainda não estiverem prontas e elas não terem para onde
ir, aí necessitando de defesa por parte do Ministério Público,
como também servir de exemplo de que a efetiva participação da
população vítima desses megaeventos aqui em causa, é exercício
de um direito capaz de dar solução condizente com a dignidade
humana e a cidadania, traduzida, por exemplo, na forma pretendida
pelo povo da av. Tronco - Vilas Divisa-Cristal do tipo “chave por
chave”.
4.3.
Também para os direitos humanos fundamentais em causa nesta área
imóvel da cidade, indica-se nos itens seguintes a base legal dos
mesmos.
5.
Indicação das bases legais dos direitos aqui em causa, arrolados
conforme os fatos acima lembrados, indicada a relação que guardam
com cada região da cidade ameaçada pelos megaeventos da Copa de
2014.
5.1. O
mínimo que se pode exigir do Poder Público, quando ele pretenda
fazer qualquer intervenção no solo urbano, capaz de afetar direitos
humanos fundamentais, como o da moradia e o da cidade, por exemplo, é
o de submeter uma tal disposição ao conhecimento das/os titulares
de tais direitos, garantindo-lhes a mais ampla informação, a
respeito, e o direito de defesa dos mesmos, inclusive na forma de
participação ativa de quem quer que seja afetado pela dita
intervenção, na tramitação administrativa que for aberta a
respeito.
5.2. Se,
na vila Floresta, esse direito vem sendo respeitado - quase
certamente pela presença ativa do Poder Judiciário no caso , isso
não acontece, pelo menos com a oportunidade, frequência e rigor
exigidos em lei, nem na área da Av. Tronco - Vilas Divisa-Cristal,
nem na área do Morro Santa Tereza.
5.3. Na
primeira, embora o Município já tenha cadastrado as famílias
afetadas pelas obras de alargamento da Av. Tronco, até hoje não
sabem qual será o seu destino. Ele criou uma Secretaria Especial da
Copa, e posteriormente um Comitê Gestor da Copa, na qual se
garantiria assento de representantes das/os moradoras/es daquela zona
da cidade, com poderes para acompanhar, opinar sobre as decisões
relacionadas com as etapas de realização das obras. Tudo isso
aconteceu em uma audiência pública coordenada pela Procuradoria da
República.
5.4. Nada
disso está acontecendo. Não se faz ata de reuniões realizadas a
respeito dela, se já foram abertas ou não as licitações, se
existem lugares e obras do programa Minha Casa Minha Vida previstos
para quem aderir a ele, se haverá alguma compensação para quem
explora pequeno comércio nas margens da Avenida, entre outras
incógnitas. O trajeto da avenida, por exemplo, atravessa três
regiões administrativas conhecidas como Regiões Glória, Cruzeiro e
Cristal, nas quais existe orçamento participativo. Aí houve
desrespeito flagrante à dinâmica própria do orçamento
participativo, pois o Município deu assento a três representantes
de uma região (Cruzeiro), ignorando a representação das outras
duas. Essa forma histórica de participação popular, conhecida no
mundo inteiro e uma das principais causas de reunião aqui dos Foruns
sociais mundiais, onde sempre estão presentes associações de
moradores, ONGs defensoras de direitos humanos, representações
comunitárias, está sendo visivelmente desconsiderada pelo Poder
Público do Município. Esse se limitou a fazer uma listagem de
pessoas afetadas pelas obras, passada aos moradores das Vilas Cristal
- Divisa. Novamente se observa, nessa conduta, como a política
pública municipal colhe dados relacionados com os direitos humanos
fundamentais, graças à organização do povo, mas deles faz uso em
prejuízo do mesmo povo.
5.5. No
que se refere à consulta pública da documentação relacionada com
o novo traçado da av. Tronco, igualmente, tudo se limitou, até
aqui, à exibição de um mapa questionado e até rejeitado por
várias/os moradoras/es. Sobre o direito de moradia, por exemplo, até
agora não deu para se perceber a possível sintonia que a política
urbana, pretendida para aquela zona da cidade, guarda com a política
habitacional. Tem-se a impressão que uma coisa nada tem a ver com a
outra, bastando mencionar o fato de que nem a cópia do cadastro
sócio-econômico das/os moradoras/es foi-lhes franqueado ter
ciência.
5.6. Os
princípios, pois, de publicidade e legalidade, impostos entre outros
à administração pública pelo art. 37 da Constituição Federal,
não tiveram até aqui o mínimo efeito sobre a intervenção pública
pretendida para ser executada na região.
5.7. Tudo
isso a margem do direito coletivo de regularização fundiária,
justamente aquele que visa compatibilizar direitos humanos
fundamentais com o direito à cidade, harmonizando as políticas
urbana e habitacional, como acima lembrado. Um exemplo disso pode
ser dado com o que está acontecendo com a vila Pedreira. Ela não
será afetada pelo novo traçado da av. Tronco, mas continuará sendo
considerada como um espaço urbano “irregular”, embora a
Associação de Moradores da Vila Cristal e Divisa esteja demandando
do Município a sua regularização fundiária desde 1993!
5.8. Não
são apenas as disposições da Constituição Federal
que sustentam o direito de moradia (art. 6º), as relacionadas
com a política urbana (arts. 182 e 183), as disposições da
Constituição Estadual (arts. 173/176), e as da própria Lei
Orgânica do Município de Porto Alegre ( arts.201/211; 230-235-A)
todas exigindo posturas não omissas do Poder Público em relação a
tal direito ameaçado nessas regiões da cidade. Causa estranheza a
ameaça que estão sofrendo essas multidões pobres, se as
administrações públicas das três pessoas jurídicas de direito
público interno lessem com um pouco de atenção aquilo que só o
Estatuto da Cidade (Lei 10257/2001) ordena a respeito do que ora
pleiteiam as requerentes, e seria suficiente para elas serem
legalmente atendidas.
5.9.
Dispõe, por exemplo, o art. 2º desta lei:
Art.
2º A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno
desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade
urbana, mediante as seguintes diretrizes gerais:
II
– gestão democrática por meio da participação da população e
de associações representativas dos vários segmentos da comunidade
na formulação, execução e acompanhamento de planos, programas e
projetos de desenvolvimento urbano;
XIII
– audiência do Poder Público municipal e da população
interessada nos processos de implantação de empreendimentos ou
atividades com efeitos potencialmente negativos sobre o meio ambiente
natural ou construído, o conforto ou a segurança da população;
XIV
– regularização fundiária e urbanização de áreas ocupadas por
população de baixa renda mediante o estabelecimento de normas
especiais de urbanização, uso e ocupação do solo e edificação,
consideradas a situação socioeconômica da população e as normas
ambientais;
5.10. No
que concerne a área imóvel do Morro Santa Tereza, guardadas algumas
diferenças, é na regularização fundiária, igualmente, que a
situação das/os moradoras/es está se mostrando sujeita a todo o
tipo de questionamento.
5.11.
Depois da extraordinária vitória conquistada pela população
local, noticiada nos itens numerados sob 3 acima, e assinado o
Decreto 48.029/2011 pelo governador do
Estado, também lembrado supra, está havendo todo o tipo de
presença, no local, de representantes da administração pública,
tanto do Estado como do município, projetando intervenções não
compatíveis entre si. Ora é a pretensão do Município de
atravessar todo o imóvel com um teleférico, ora é a pretensão do
Estado de instalar um parque em fração daquela área, ora é o
retorno da ideia de se expandir as instalações da Fase, nem um nem
outro desses entes públicos dando notícia de qualquer decisão por
tomar ou já tomada sobre o pedido de concessão de uso que as
requerentes representantes da dita área já formularam ainda em
abril deste ano..
5.12.
Como se tudo isso fosse pouco, ainda pende de sentença uma ação
civil pública (processo 1.09.00935948
tramitando na Vara 4º Vara da Fazenda) contra a Fase, visando
responsabilizá-la pelo risco presente em frações do bem de seu
domínio nas quais existem pessoas residindo em casas situadas sobre
declives profundos, sujeitas a serem levadas por enchentes.
5.13. O
Estado do Rio Grande do Sul, em cumprimento ao disposto no art. 27 do
Ato das disposições constitucionais transitórias de sua
Constituição, já editou mais de uma lei favorável seja à doação,
seja à concessão de uso de imóveis do seu domínio. Essa da
concessão, por exemplo (10.851/96) já abriu possibilidade para o
Estado dispor dessa forma sobre suas terras devolutas.
5.14.
Como ocorre, todavia, com a simples lembrança do Estatuto da Cidade
para sustentação dos direitos cá reivindicados, também a leitura
do art. 1º da Medida Provisória 2220/2001 é suficiente para
reduzir a insustentabilidade qualquer objeção que pudesse
questionar o direito das/os moradoras/es dessa área a conservação
de suas posses-moradia:
Aquele
que, até 30 de junho de 2001, possuiu como seu, por cinco anos,
ininterruptamente e sem oposição, até duzentos e cinqüenta metros
quadrados de imóvel público situado em área urbana, utilizando-o
para sua moradia ou de sua família, tem o direito à concessão de
uso especial para fins de moradia em relação ao bem objeto da
posse, desde que não seja proprietário ou concessionário, a
qualquer título, de outro imóvel urbano ou rural.
5.15.
Frente a tais disposições de lei, a única área imóvel sobre a
qual o Poder Público deu alguma atenção foi, justamente, a da Vila
Floresta, coisa que dispensa suas/seus moradoras/es de se socorrerem
delas, pelo menos até novembro deste ano, conforme expuseram acima.
6.
Do quanto é justa, oportuna, legal e urgente a intervenção do
Ministério Público em situações conflitivas como essas.
6.1. Desde
que foi empossado, o novo procurador geral de justiça do Estado, é
visível a mudança radical de posicionamento desse Órgão
integrante do Poder Judiciário no que se refere à defesa dos
direitos humanos fundamentais, como aqueles que, nessas áreas
urbanas de Porto Alegre, estão sob sério risco ou, até, já
violados. Por isso mesmo, as requerentes estão tomando a presente
iniciativa, com a convicção de que serão ouvidas e as suas
reivindicações devidamente apuradas e atendidas.
6.2. O
Ministério Público, como é sabido, seja o estadual seja o da
Procuradoria da República, dispõe de notáveis instrumentos
jurídicos capazes de prevenir os muitos conflitos que essa
conjuntura social gera e, onde eles já se instalaram, até evitar o
ingresso em juízo das pessoas neles envolvidas. É verdade que, como
todo o instrumento legal, esses também podem ser utilizados para o
bem ou para o mal das pessoas, especialmente quando, naqueles casos
em que se encontra em causa direitos humanos fundamentais, como o da
moradia, deixam de serem ouvidas as pessoas pobres que gozam de tal
direito, mas, pelo fato de não terem alcançado titulação
documental relativa aos seus espaços, ainda aguardam o
reconhecimento público e privado de tal direito.
6.3. A
competência constitucional, em matéria de solo urbano sobre o qual
existem direitos de moradia de multidões pobres, como é o caso das
áreas urbanas afetadas pelos megaeventos da Copa do Mundo, se
distribui de maneira comum, exigindo de todas as pessoas de direito
público interno a participação ativa de cada uma, sempre que
aqueles direitos fundamentais estejam sob risco.
6.4. Ora,
existem instrumentos jurídicos adequados para, conforme o caso,
solucionar questões ou conflitos derivados daquele risco, de modo a
poupar-se à população desses espaços físicos considerados
“irregulares” a injustiça remota ou presente de ver violado o
seu direito a moradia. Podem ser lembrados aqui o inquérito civil
público ou até, conforme o caso, o Termo de Ajustamento de Conduta
- TAC.
6.5. Em
que medida uma iniciativa dessas, processada em defesa da moradia do
povo que reside em cada uma daquelas áreas acima lembradas poderia
cumprir essa finalidade? Com o andamento de uma tramitação
processual administrativa, presidida por esse Ministério Público,
que estabelecesse pauta previamente conhecida pelas requerentes e
pelos representantes do Poder Público responsáveis pela garantia
dos direitos em causa. no espaço e no tempo condizentes com a
relevância e urgência desses direitos nesses mencionados espaços
urbanos.
6.6. É
claro que, como ocorre em qualquer tramitação desses processos, há
necessidade de inclusão de participantes com direito a voz e voto,
aí incluídas/os representantes das/os moradores/as daquelas áreas
imóveis acima referidas, conforme prevê o Estatuto da Cidade em seu
art. 2º inciso XIII.
6.7. Não
seria de se excluir, então, o interesse de pessoas jurídicas como a
da Caixa Econômica Federal nesse tipo de iniciativa, por tudo quanto
o programa Minha Casa Minha Vida lhe confere de atribuições, do
Departamento Municipal de Habitação (Demhab), da Secretaria de
Habitação do Estado, e de outras entidades públicas e privadas
ligadas ao problema.
6.8. O
que não pode continuar acontecendo é a acentuação das incertezas,
inseguranças e até injustiças presentes na mente e no coração
das multidões pobres de Porto Alegre, afetadas direta ou
indiretamente pelos megaeventos planejados aqui para cumprirem uma
determinação externa, da Fifa, para realização de jogos da Copa
do Mundo de Futebol de 2014, como se isso fosse mais importante,
urgente e necessário do que o Poder Público garantir o exercício e
o gozo de direitos humanos fundamentais, historicamente a espera de
serem reconhecidos.
DIANTE
DE TODO O EXPOSTO, requerem a Vossa Excelência,
Seja
aberto nessa Procuradoria de Justiça, um inquérito civil público
que, instruído quanto baste, busque efeito jurídico eficaz
constituído pela tomada das seguintes providências:
Intervenção
imediata desse Órgão para dar ciência a quem entender de direito
sobre todas as responsabilidades legais, político-jurídicas, que
pesam sobre o Poder Público para, conforme o caso, prevenir lesão
de direito humano fundamental presente nesses casos, reparar o que já
tiver sido violado, oferecer resposta ao que já lhe tiver sido
requerido.
Abertura
de processo de mediação sobre posições conflitantes que já
estejam em curso ou que venham ainda a ocorrer no futuro, para tanto
se oferecendo garantia às/os moradoras/es dessas áreas urbanas:
- de acesso à mais ampla informação sobre projetos que as/os afetem, cópia integral de seus cadastros, andamentos de obras, sejam para abertura de vias, sejam para a construção de moradias, seja para as regularizações fundiárias.
- de discussão e participação nas decisões a serem tomadas sobre o seu próprio destino.
- de que não haverá execução administrativa de qualquer medida coercitiva do tipo despejo, por exemplo, de qualquer família atingida por obras dos megaeventos seja de forma indireta (aluguel social, casa de passagem e até o bônus moradia para quem não se habilitar a nenhuma dessas chamadas “vantagens”) seja de forma direta.
- de que a política urbana do Poder Público não será feita em prejuízo da habitacional, respeitado o seu direito à moradia digna, em local apropriado para sua família e com acesso a todos os bens e serviços previstos pela regularização fundiária, próprios dos direitos de cada um/a a sua cidade.
- de que sejam respeitados os encargos públicos sobre os prazos de regularização fundiária para as famílias que permanecerem em suas posses atuais, não afetadas por mudança, mesmo durante a realização dos megaeventos.
- de que possíveis desapropriações de áreas imóveis, julgadas indispensáveis à mudanças de famílias dessas áreas, lhes façam reserva expressa de futura utilização em favor delas, as que tenham renda até três salários mínimos.
- De que as audiências públicas, julgadas necessárias à tramitação deste inquérito, possam ser, conforme o caso, presididas pelo Ministério Público e realizadas tanto no próprio local onde os direitos humanos fundamentais aqui em causa estão sob risco ou, até, já violados, o mesmo valendo para aqueles casos onde a pauta em discussão aponte para a conveniência exija coordenação .
PORTO
ALEGRE, 10 DE AGOSTO DE 2012.
- ACESSO CIDADANIA E DIREITOS HUMANOS
- AMIGOS DA TERRA BRASIL
- ASSOCIAÇÃO DE MORADORES E AMIGOS DA VILA ECOLÓGICA
- ASSOCIAÇÃO DE MORADORES E AMIGOS DA VILA ECOLÓGICA
- ASSOCIAÇÃO DE MORADORES DA VILA GAUCHA
- ASSOCIAÇÃO DE MORADORES DA VILA PADRE CACIQUE
- ASSOCIAÇÃO DE MORADORES DA VILA PADRE CACIQUE
- ASSOCIAÇÃO DE MORADORES DA VILA UNIÃO SANTA TEREZA
- ASSOCIAÇÃO DE MORADORES DAS VILAS DIVISA E CRISTAL
- ASSOCIAÇÃO DE MORADORES DAS VILAS DIVISA E CRISTAL
- ASSOCIAÇÃO DOS GEÓGRAFOS BRASILEIROS - AGB Seção Porto Alegre
- CENTRO DE DIREITOS ECONÔMICOS E SOCIAIS - CDES
- CIDADE
- COMITÊ
POPULAR DA COPA DO CRISTAL
- FEDERAÇÃO
GAÚCHA DAS ASSOCIAÇÕES DE MORADORES - FEGAM
- FÓRUM ESTADUAL DE REFORMA URBANA – FERU/RS
- LEVANTE POPULAR DA JUVENTUDE
- MOVIMENTO EM DEFESA DO MORRO SANTA TEREZA
- QUILOMBO DO SOPAPO
- UNIÃO DE VILAS
- VILA FLORESTA
- VILA FLORESTA
- Fabiana Raquel dos Santos Pereira
- Juliana Feronatto Mesomo
1
VAINER, Carlos Bernardo. Texto disponível na internet.
http://pfdc.pgr.mpf.gov.br/atuacao-e-conteudos-de-apoio/publicacoes/direito-a-moradia-adequada/artigos/cidade-de-excecao-carlos-vainer.
Um comentário:
Olá,
já assistiram ao programa que a TV Câmara preparou sobre a organização dos moradores ameaçados de remoção pelos grandes eventos esportivos?
É o segundo programa da série Lance Legal e está disponível no endereço youtube para visualização.
Lance Legal - remoção de moradores e Lei Geral da Copa:
http://www.youtube.com/watch?v=3pTRzF8d6-k&list=PLD82ACCDA82952671&index=2&feature=plpp_video
Os outros programas da série podem ser visualizados aqui: http://www.youtube.com/playlist?list=PLD82ACCDA82952671&feature=plcp
O programa também está disponível para download no site da TV Câmara.
Abç,
G.
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