Uma das pessoas que já têm moradia mais estruturada é Carlão, que possui a única cama avistada pela reportagem no local. Morando lá há 30 dias, numa área com teto, ele também conta com um fogão e uma pia. “Tinha muito assalto com isso aqui vazio, então os vizinhos até comemoraram quando a gente chegou”, narrou.
Já na área do esqueleto, em que alguns espaços têm teto e outros apenas paredes, Roberto, que preferiu não falar seu sobrenome, afirma que morava sozinho há seis meses ali. “Ele até comemorou que agora tem alguém com quem conversar”, brincaram os amigos que estavam com ele. Aliás, quase sozinho: ele tem a companhia de sua galinha, Cocó, que pegou na rua enquanto trabalhava com reciclagem.
Durante a Copa do Mundo, Roberto costumava assistir aos jogos em um bar, onde prometeu levá-la para “comer com massa”. “Parei de ir no bar. Ela virou minha companheira, agora passo fome, mas não como a Cocó”, contou, sob os risos dos outros cinco moradores que confraternizavam e cozinhavam em um fogão à lenha improvisado numa das áreas abertas do esqueleto.
As histórias de tragédias provocadas pela enchente continuam: enquanto Robson Alves e sua esposa Juliana conseguiram sair de onde moravam, a mãe dele permanece na beira do valão com seus cinco filhos pequenos, especialmente porque não tem condições de ir para a ocupação com as crianças, devido à falta de luz e de água no local.
“Pra mim, melhor aqui do que na frente do valão. Dá pra pegar água de uma torneira ali”, apontou Juliana, de aparência jovem, mas voz firme. Ela morava em uma casa de madeira que “encheu de água” até decidir se mudar. “Agora disseram que a gente tem 15 dias para sair, mas vão ter que indenizar a gente, porque não temos onde ficar. É uma pouca vergonha nos tirarem daqui e não dar casa”, afirmou.
A decisão judicial
A liminar foi expedida pela Vara Cível do Foro Regional Tristeza da Comarca de Porto Alegre, pelo juiz Mario Roberto Fernandes Corrêa. Na decisão, ele observa que “cada dia novas pessoas estão ingressando no local, bem como estão ocorrendo prejuízos ao meio ambiente em área de preservação e há notícia que comercialização ilegal de lotes”. O magistrado intimou os ocupantes a cumprir a liminar, autorizando o “uso da força pública pela Brigada Militar”, caso não haja cumprimento da determinação judicial. A reintegração foi pedida pela construtura Melnick Even, que preferiu não se manifestar sobre o caso.
Para reverter a decisão, o advogado Gilmar Rossa pedirá um agravo de instrumento, argumentando que a área está abandonada há pelo menos três anos. “Isso pode ser facilmente comprovado pelas condições do imóvel, que teve os portões arrancados, a guarita destruída, o telhado furtado ao longo desse tempo”, alegou.
De acordo com ele, são cerca de 500 famílias que querem destinação digna para o espaço e condições de moradia. “Todos os ocupantes vêm de áreas de sub-habitações, casas que constantemente são inundadas pela chuvas, pelos arroios”, explicou Rossa, que é advogado popular e faz a defesa das famílias gratuitamente.
Para buscar alternativas, os moradores contataram a vereadora Sofia Cavedon (PT), que visitou o local no último sábado (12) e entrou em contato com o Ministério Público, conseguindo uma reunião com a Promotoria de Justiça de Habitação e Defesa da Ordem Urbanística, marcada para quinta-feira (17).
“Queremos conseguir uma mediação jurídica e política, para ver se mobilizamos conjunto de órgãos que tratam de habitação, ver como podem ajudar e qual a situação daquele terreno”, afirmou a vereadora. Os moradores também buscam conseguir uma reunião com a Comissão de Urbanismo, Transporte e Habitação (Cuthab) da Câmara.
Confira mais fotos da ocupação no site do Sul21.
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