Fonte: RS Urgente
Jacques Távora Alfonsin
Datas comemorativas de
acontecimentos históricos, dignos de serem relembrados, quase sempre são
marcadas por dor, sofrimento e mortes heroicas. Se o natal foge a essa regra,
até a páscoa é precedida de uma sexta-feira de cruz. Geralmente essas datas
lembram gente sacrificada em defesa de direitos, na sua época considerados
subversivos da ordem e da segurança, posteriormente reconhecidos como devidos e
introduzidos em lei, provocando sentimentos de nojo da repressão sofrida no
passado e pasmo diante do atraso em serem respeitados.
Assim como 20 de novembro
marca o dia nacional da consciência negra, por ser o dia do assassinato de
Zumbi, em 1695, no quilombo de Palmares, como 8 de março foi consagrado como
dia internacional da mulher, para recordar a morte das mulheres que, ainda no
século XIX reivindicavam melhores condições de trabalho e direito ao voto, em
Nova York, como 17 de abril foi reconhecido como o dia internacional da luta
camponesa, em memória do massacre de Eldorado do Carajás em 1996, 1º de maio
não foge a essa “regra”.
A data lembra um protesto de
trabalhadores, em Chicago, no ano de 1886. Um dia depois a polícia dispersou
outro, matando um dos manifestantes. Em reação a um terceiro, no dia seguinte,
reunindo multidão de trabalhadoras/es inconformadas com aquela morte, a policia
matou mais doze e feriu outros tantos.
Passado tanto tempo, existe
alguma novidade nas freqüentes passeatas, manifestações de rua, aqui mesmo no
Brasil, relacionadas com greves, reivindicações salariais, ameaças de
desemprego, perda de direitos conquistados a custa de tantas mortes no passado?
A marca permanente desses
protestos, por mais que se queira pintar as motivações com outras cores, mais
“civilizadas”, mais “pacíficas”, é a da velha e conhecida luta de classes, com
o capital de um lado, indisposto a qualquer concessão subtraída ao seu lucro e
o trabalho de outro, indisposto por sua vez a prosseguir sendo explorado
injustamente.
O mar de ideologias e
conveniências políticas aliadas de um e outro desses lados, as divisões
externas e internas presentes neles, ainda são incapazes de esconder o fato de
que as tentativas legais de disciplinar a liberdade concentracionista de
dinheiro do capital, em defesa da libertação da pobreza e até da miséria
presente nas vidas das/os trabalhadoras/es, ainda estão muito longe de
conseguir uma partilha equitativa da nossa riqueza, eliminando as causas
econômico-políticas da nossa escandalosa desigualdade social.
Luiz Carlos Bresser Pereira
deixou muita gente preocupada por ter desvelado e condenado publicamente uma
dessas causas, talvez a principal delas. Na entrevista concedida à Zero Hora de
domingo passado (edição de 27 de abril disponível na internet), embora
mostrando flagrantes erros presentes na política econômica do segundo mandato
da Presidenta Dilma, responsáveis, segundo sua opinião, pela crise atualmente
vivida no país, Bresser bateu no fígado do capital, à uma pergunta sobre
corrupção:
“Os ricos nunca gostaram e
temem a democracia”. (…) Eu disse que a classe capitalista teme a democracia, e
precisa controlá-la. E como faz isso? Desmoralizando o Estado e o político e
comprando o político. E é isso que a classe capitalista faz com essa coisa
escandalosa que é o financiamento de campanha por empresas.” (…) Porque a
corrupção é inerente ao capitalismo. A lógica do capitalismo é a lógica do
lucro, e o critério de êxito é a riqueza.”
Não há necessidade de se
transpor uma tal lição para as relações entre o capital e o trabalho, para se
provar a razão daquelas mortes acontecidas no passado levarem tantas/os
trabalhadoras/es para as ruas no dia 1º de maio. Elas/es não querem a repetição
dos efeitos desse lucro sujo, aí denunciado, nem no presente, nem no futuro,
como a terceirização do trabalho, por sinal, ameaça impor.
Os males da injustiça social
sofrida historicamente pelas/os trabalhadoras/es é certo serão denunciados
novamente nesse dia, sem ocultação das suas causas. Mas é certo também estarem
elas/es muito menos interessadas/os na pirotécnica dos shows organizados pelas
centrais sindicais do que nas propostas a serem discutidas por elas, pelos
movimentos populares aliados, no efetivo empoderamento da defesa dos direitos
humanos fundamentais sociais conquistados no passado, agora sob risco iminente
de violação.
Se alguma festa o lazer de 1º
de maio vai garantir, portanto, será a de um abraço entusiasmado de união de
todo esse povo, consciente e disposto a não continuar sendo enganado por
Estados de direito e democracias aparentes, sufocadas por liberdades econômicas
impeditivas de libertação social. Se são graves os efeitos da corrupção
política, com justa razão atualmente sob rigorosa investigação no país, a multidão
de oprimidas/os por um sistema econômico visceralmente corrupto merece ser
defendida com muito maior empenho e rigor, pois além de integrar a causa da
primeira, seu efeito mais injusto e perverso se faz sobre a segunda.
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